Fernando Andrade entrevista o poeta Thássio Ferreira sobre o livro “Lagarta chã”

Thássio Ferreira - Fernando Andrade entrevista o poeta Thássio Ferreira sobre o livro "Lagarta chã"

 
 
 
 
 

Fernando Andrade-) Há alguma coisa por trás da banalidade da vida nos seus poemas. Uma faísca onde as danças do desejo podem afetar o mundo de modo até lúdico. É preciso além de ler, agir no movimento das pernas, do movimento sinuoso das mãos. Comente sobre isso.

Thássio Ferreira – Os poemas do lagarta chã expressam esse movimento de vida que é simultaneamente individual e coletivo, e opera tanto internamente quanto externamente, e nas trocas entre esses dois campos. Os poemas mais intimistas dialogam com os políticos, na medida em que o íntimo é influenciado pelo social, pela realidade coletiva, e na medida em que as ações exteriores, que incidem na relação com a realidade à nossa volta, são também influenciadas pelas disposições íntimas. Daí talvez essa faísca dançante, relacional, que pulsa de algum modo convocando tanto à reflexão quanto ao agir.

Fernando Andrade-) A palavra para você é tão contorcionista quanto um dançarino para o movimento da dança. Há uma sinuosidade, nos seus versos, que botam o leitor para cantar e dançar. Fale um pouco da sua gesta de criação.

Thássio Ferreira – O começo de um poema costuma ser espontâneo, intuitivo, palavras que se articulam, às vezes com alguma ideia às vezes apenas com o som e as imagens. Quando dou sorte, consigo agarrar essa “célula-tronc” e desdobrá-la em poema, sempre com bastante esforço, trabalho, apuro. Para mim a palavra é instrumento, não é sacralizada, o que me permite bastante liberdade para brincar e construir com ela do modo que me pareça alcançar a melhor expressão poética.

Fernando Andrade – A consciência política não abandonou sua estética quase de guerrilha contra a violência urbana, e política, nos seus poemas. O poema pode ou não se ver com um panfleto. Comente.

Thássio Ferreira – Não como um panfleto, justamente porque o panfleto pretende convencer alguém de algo. O poema não pretende convencer ninguém de nada, ele busca impactar esteticamente, o que não o impede de abordar questões políticas, sensibilizar quem lê para este ou aquele assunto. Mas o panfleto tem um propósito específico, e usualmente sua forma vai se condicionar a esse objetivo. Com o poema, dá-se o contrário, sua forma é o mais importante, é incondicionada, porque ele é sobretudo um objeto estético (mantida a ética que se deve ter sempre em qualquer coisa).

Fernando Andrade – Queria que você falasse um pouco sobre o ego e a poesia, seria uma boa semente para ampliar uma floração identitária. Fale disso.

Thássio Ferreira – A mim parece que a ideia de ego, como essa consciência de si, que permeia quase toda a experiência humana, é inevitável, no sentido de que sempre vai haver uma influência egóica em tudo que fazemos. Mas é importante enxergar e entender isso, mediar essa influência, para não sucumbir a uma viagem ególatra, na poesia como em qualquer atividade. Talvez a poesia seja um meio propício a esse descontrole, o que torna a vigilância e uma certa lucidez em lidar com a questão ainda mais importantes.

Please follow and like us:
Be the first to comment

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Social media & sharing icons powered by UltimatelySocial