Fernando Andrade entrevista o escritor e poeta Cefas carvalho

CEFAS CARVALHO 2 - Fernando Andrade entrevista o escritor e poeta Cefas carvalho

 
 
 
 
 
 

Fernando Andrade: O desejo parece ser a porta para entrar nos seus poemas. Mas não desejo cuja retidão leve à segurança, mas sim a liberdade do perigo, do acaso, da escolha. Um desejo de tremor de terra, de espaço. Fale um pouco destas escolhas estéticas. 

 

Cefas Carvalho: De fato, muitos dos poemas escolhidos para entrar no livro falam do desejo, em diversas vertentes, do incompleto ao consumado, do carnal ao imaginado. Este é um dos conceitos de “Sismos”, até porque o desejo, observando aí a pulsão sexual, me remete justamente à terra, solo, chão, coisas concretas. Tenho em mim que terra (no sentido de chão) leva mais ao desejo, ao erótico do que o ar, que remete a um romantismo que minha poesia não almeja e não atinge.

 

Fernando Andrade: Você adota uma poesia musical, onde a rima, é parte constitutiva do verso. Fale um pouco desta opção  pela musicalidade dos seus poemas.
 
Cefas Carvalho: Há tempos existe uma discussão infértil e sem sentido sobre a poesia “ideal” ter que ser rimada ou não. A poesia livre é maravilhosa, admiro muitos e muitas poetas atuais que têm fantásticos trabalhos com poesia totalmente livre, às vezes experimental até. Mas a chamada “poesia rimada” não precisa ser necessária encaixotada, como no rigor métrico e rítmico de um soneto ou uma trova. Poetas como Cecília Meireles, por vezes João Cabral de Melo Neto, para ficar apenas nos canônicos, trabalham maravilhosamente bem com rimas “fora das regras”, justamente aí nasce a musicalidade. Chico Buarque faz isso muito bem em suas letras, procuramos rimas que não necessariamente se encaixam no final dos versos e sim no meio ou em pontos do verso que produzam uma musicalidade no momento do canto ou da declamação.
 
Fernando Andrade: Há uma relação temática com a mitologia grega, muitos poemas falam da morte. Por que optou por esta relação com a filosofia grega. Comente.   
 
Cefas Carvalho: De fato tenho um fascínio desde a infância pela mitologia grega e isso acaba saindo de mim de maneira até subconsciente nos poemas na fase madura. Possivelmente essa afinidade com a mitologia grega aconteça pelo seu antropoformismo, com deuses e homens tendo os mesmos medos e desejos, isso sempre me atraiu muito e na hora da inspiração (ou da transpiração) imagens das histórias gregas, sempre evocando destino, desejos, ódios, retaliações e mágoas, acabam aparecendo. Considero também que a mitologia grega, bem mais que outras mitologias, como a judaica que deu origem ao cristianismo, se prende mais à terra, ao chão, que, como conversamos, é o terreno, digamos, onde minha poética se situa. 
 
Fernando Andrade: Há uma certa relação entre uma religião de retidão cristã com certo paganismo onde corpo só obedece aos desígnios  do desejo sem culpa. Fale um pouco desta dicotomia entre lados.  
 
Cefas Carvalho: A dicotomia existe mais no fato da consciência e compreensão que existe uma cultura judaico-cristã que nos formou e nos rodeia, mas que se mostra quase sempre restritiva e hipócrita. Então cabe a cada um de nós, poeta ou não, reagir de maneira pessoal a este cerceamento que a religião tenta fazer com nossas vidas, vide a extrema-direita que ficou no poder quatro anos se usando dos evangélicos, em especial dos neopentecostais, misturando estado com religião. Minha poética cada vez mais rejeita as regras que essa “retidão” cristã e suas regras e leis que quase nunca são cumpridas pelos próprios cristãos, tenta nos impingir coletivamente. E há muito tempo me atrai a ideia do paganismo, cheguei a estudar por um tempo a religião da deusa, a wicca, além de ritos religiosos dos povos originários, de maneira que na cultura não-cristã (chamemos assim, em vez de “pagã”) ou, melhor, pré-cristã, o desejo era visto com bons olhos e até estimulado. Gosto da poesia que se propõe a resgatar esses desígnios do desejo, como você definiu.
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