Quatro Marias é um livro de contos movido para encaixes | Fernando Andrade

 
 
 
 

Fernando Andrade | escritor e jornalista

Pela estrutura de mosaico com suas partes-contos conectadas num plano de fundo, que repercute a história do país, culturalmente. E também um livro que escuta esta história no seu novelo mais fabular e romanesco. Amplifica o estudo do feminino e do feminismo, dialogando com blocos de movimentos do andar da carruagem de uma sociedade que pouco evoluiu no material humano.
Alvaro engendra histórias de mulheres, todas chamadas Marias, numa elegia bem do nosso melhor cancioneiro, Milton Nascimento – paisagens de faces de uma mesma mulher brasileira? Imersa ainda numa cultura escravagista do século dezenove. É interessante notar que o autor dentro de sua novelas-contos destaca o negro e seus personagens como um elemento que fomenta como se resolve conflitos, sendo um espécie de mediador. Tanto no primeiro conto como no segundo, eles alteram o movimento e o desenho de como a progressão da história se faz.
Álvaro não descontextualiza o perfil cultural das mulheres antes da abolição. Embora no primeiro, a personagem Maria de Mercês se roge na altivez de uma fuga aos padrões culturais da época numa bela cena onde solta a égua do seu marido. Álvaro dinamiza não o menor, o ato solitário de um movimento íntimo de alguma personagem. Embora reflita sobre eles, o autor procura uma visão angular sobre todos os estereótipos de cultura que o Brasil arrendou do que chamou padrão cultural da terra, do solo ligado pelas raízes colonizadoras.
O movimento é dialético, no decorrer do processo de escrita de Álvaro, pois ele pensa seus contos como blocos hegemônicos da história da sociedade patriarcal brasileira. Marias vão se conhecendo entre os primeiros contos e os segundos e os terceiros, a individualidade das personagens vão se amalgamando numa sólida consciência de gênero. Maria da Conceição já não é mais a de Mercê, a luta nas fábricas por melhores condições não é nem parecida com a escravatura antes da lei áurea.
No último conto em formato teatral, as rupturas perfazem a construção mental na interiorização do que cada Maria quer para si. Quebras de estereótipos de gêneros e novas associações entre o virtual e o espaço privado dão a noção de nova estrutura crítica tanto da escrita como da forma de ver e entender as relações sociais e pessoais.

 

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