Livro de contos Cajila sonda as vozes narrativas por trás de enredos abertos ao espaço da criação | Fernando Andrade

Fernando Andrade | escritor e crítico de literatura

Se a voz no teatro não necessita de muitas funcionalidades, um ator com voz grave, pode ter um certo perfil para ele na composição. Na música o tom da voz, seu timbre parece ser fundamental para o equilíbrio da melodia. Ela é a própria face ou faceta do trabalho do músico. Na literatura, a voz também serve por vezes de empréstimo quando o autor se vê trabalhado por um outro que vem depois ou até na mesma época. Uma sintaxe próxima quanto à linguagem, enredo, e gênero. Dos livros que li recentemente, o novo do Sérgio Fantini, Cajila, pela editora Caos e letras me fez emergir completamente na audição de um dos mais fantásticos escritores do século XX: Italo Calvino.

Sérgio parte também de um livro sem gênero definido, com contos onde a linha cujo temas e sinais podem ser rebatidos na urdidura de um romance. Uma voz que surge de dentro do corpo, sem contorno, uma voz desencarnada de um eu existencial. Sempre pensei que Calvino trabalhasse o personagem de forma científica, onde reflexões, pensamentos, raciocínios, se interpenetram num eu com potência de vontade.
Esta relação também vi nos contos do autor, onde o trabalho narrativo é bem mais minucioso que o enredo, ou as paisagens por onde o conto se passa. Sérgio trabalha com a bela cor da pele preta, em situações bem íntimas de pertencimentos onde a fala é atravessada por noções de alteridade e de relações de gêneros.

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