Fernando Sousa Andrade entrevista a escritora Sandra Godinho

Sandra Godinho 2 - Fernando Sousa Andrade entrevista a escritora Sandra Godinho

 
 
 
 

FERNANDO SOUSA ANDRADE: Há muitas mudanças de rumos na sua narrativa deste romance. Personagens desaparecem, a navegação do destino dos personagens parece se mover como a correnteza de um rio. Nada é fixo em sua trajetória. Este tipo de movimento sinuoso como você arquitetou na escrita para ter esta sensação no leitor de movimento?

SANDRA GODINHO:  Quando vislumbrei a história, logo de início concebi o personagem de Messias Machado empreendendo essa travessia, que serviria de metáfora para um exame de consciência, em que ele teria a oportunidade de avaliar suas escolhas de vida.
É um personagem em surto psicótico devido a um trauma emocional que o desestabilizou momentaneamente, obrigando-o a encarar sua vida, as atitudes tomadas e suas consequências, de modo lisérgico, em delírio e desespero. Para tanto, também eu mergulhei na história das ruínas de Paricatuba. E os paricás, planta nativa do local, funcionaram perfeitamente bem para meu intento.

FERNANDO SOUSA ANDRADE:  O destino social parece ter um mito trágico para os personagens que buscam ir além de suas fronteiras físicas e emocionais. A relação entre bem e mal, certo errado, a lei, são balizas para o personagem se encolher ou se afrontar pelo ambiente que nasceu ou vive. Queria que você falasse um pouco de Messias com relação a estes enfrentamentos sociais dele no meio ambiente que vive?

SANDRA GODINHO: Messias Machado funciona como o arquétipo daquilo que já existe em nossa sociedade: a pessoa que, para vencer na vida, lança mão de tudo e de todos para atingir seu objetivo. Messias Machado é a encarnação do oportunismo, do matar ou morrer, do ‘dane-se os outros’. Não há respeito às ideias e aos valores alheios, nem empatia com o Outro, nem diálogo possível, só o ‘Eu’ impera. E esse ‘Eu’ admite qualquer vale-tudo.

FERNANDO SOUSA ANDRADE:   O romance para seu 2\3 finais toma uma potência alegórica forte quando ele vai para um certa prisão e depois, para um leprosário. As imagens tomam uma outra dimensão que misturam um pouco do delírio? Onde o realismo se dilui um pouco perante as relações entre contrários doença x sadio, morte \ vida. Paz\culpa. Por que adotou esta linha de estilo entre o delírio de um certa entrada no fantástico, com uma alegoria sobre a condição humana?

SANDRA GODINHO: Eu diria que, para esse arquétipo representado no romance, não há bem ou mal, certo ou errado. Tudo é possível e passível de ser empregado conforme a oportunidade se apresente. Messias Machado fará qualquer coisa para atingir seu objetivo, poder, posição ou uma boa situação financeira. E existem muitos Messias Machados por aí, que não ligam para as minorias e nem sabem conviver com as diferenças. Achei a criação do personagem de Messias Machado perfeita para retratar essa condição humana tão presente em nossos dias e em nossa sociedade.

FERNANDO SOUSA ANDRADE:    A pulsão no humano não vai até seu trágico fim? O desengano, a culpa e o remorso? São elementos que trazem alguma redenção e apaziguamento a seu personagem?

SANDRA GODINHO: Eu diria que o trágico fim do personagem é sua incapacidade de mudar. Para ele, por mais que tente, não há redenção nem apaziguamento, ele não reconhece seus erros, nem suas fraquezas. Tanto é assim que a parte boa de Messias, representada pelo índio Maiká, acompanha-o ao final da jornada na esperança de um dia o levar a uma redenção, ao reconhecimento de sua culpa na tragédia que se abateu sobre ele e sobre sua família. Messias Machado é o conjunto de todos os personagens. Ele é o menino Max, em sua ambição; é Mássimo, em seu oportunismo; é Maiká, em sua bondade; é Maliciano, em sua prepotência, é Marco, em sua arrogância e podridão. Messias Machado é um pouco de cada um de nós.

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This Article Has 1 Comment
  1. Roberto Monteiro Reply

    Não li, ainda, mas já gostei… MESSIAS MACHADO… seria mera coincidência???

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