Romance ‘A morte é a promessa de algum fim’ abre todos os espaços cênicos para a fabulação de um homem em busca de um norte humano e espiritual | Fernando Andrade

Sandra Godinho 2 - Romance 'A morte é a promessa de algum fim' abre todos os espaços cênicos para a fabulação de um homem em busca de um norte humano e espiritual | Fernando Andrade

Fernando Andrade | escritor e crítico de literatura

 
 
 
 
 

O desejo é um arco que nunca se fecha num círculo. Não é uma linha reta, pois se move sinuosamente por entre bloqueios, sinalizações e esperanças. O desejo precisa da rua, do espaço público, para seu caminhar que pode ser plácido, ou rápido com uma flecha. Ele também nos forma como identidade nas relações especulares da família. Da onde venho, que espaço físico me detenho, proponho, se pus os pés num lugar onde água tem elemento formador, com sua volúpia de transformação em estados da alma. Mas o desejo também pode ser um violento tremor do corpo quando visto pela posse, pelo pulo da gangorra social. “A grana que ergue e destrói coisas belas”.
Quando ele é erguido sobre um corpo teórico onde a ópera nos dá sua importância e relevância em não demarcar suas posições e posturas, marcações rítmicas. A ópera desgoverna um trajeto certo, de narração, é uma violenta tempestade de ações e movimentos de guinadas, para um lado ou outro numa tempestade poética das palavras. Sandra Godinho, em seu novo romance, A morte é a promessa de algum fim, editora Penalux, desnorteia com a mão forte e segura este leme da sua história que não tem pontos cardeais fixos nem destino certo.
Messias não está na cabine da embarcação, ele está fora, no olho do furacão sendo perseguido por relações sociais que ele parece entender, mas que fogem ao seu controle. Sandra nos envolve na região amazônica, novamente, com suas matas, seus índios, a relação entre ciência e paganismo, personagens que entram na mata e desaparecem ferozmente como uma picada de trilha perigosa. A autora com uma escrita que vai do poético ao musical, deixa na sua estrutura romanesca todas as janelas abertas de uma significação que não seja estanque para seu leitor. É ele que move a história, pois sua percepção aflora pequenos detalhes que autora pinça aqui e ali como pedaços de folhas escondidas embaixo da relva.
O fantástico abre os espaços do lugar onde o livro se fixa, mas Sandra desmantela estes nortes e sul(s) com um trabalho rico de ambivalência humana para com o mito do bom selvagem. Nos dois terços finais o livro dá uma guinada para um certa relação agônica com a alegoria, o peso da consciência de Messias aflora com todo tamanho de suas ações sobre suas lembranças e passado. Medo, culpa, remorso, redenção, são caminhos que o personagem precisa interiorizar dentro de si para não se levar ao amargo fim. A doença como metáfora de um universo em decomposição ético e moral.

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