Fernando Andrade entrevista a escritora Viviane Ferreira Santiago

Viviane Santiago livro - Fernando Andrade entrevista a escritora Viviane Ferreira Santiago

 
 
 
 

FERNANDO ANDRADE: Sua escrita é muito calcada no afeto. Acho que é importante retratar o tema das benzedeiras, para além da relação de fé, apenas. Comente.

VIVIANE SANTIAGO: Minha escrita realmente possui uma visível vertente afetiva, isso é traço em todas as minhas obras. O que não deixa que a mesma perca a imersão no trabalho técnico, fruto de muita pesquisa, como é o caso do livro em questão, Por amor eu te Benzo, eu te livro, eu te curo. As Benzedeiras de São Paulo, foi produzido em paralelo a muita investigação de campo e acadêmica. Claro que existe todo o teor histórico e social no tema abordado, mas a fé é o instrumento base de trabalho destas mulheres, ir além da relação de fé requer o cuidado da preservação para que um ofício secular não seja descaracterizado . 


FERNANDO ANDRADE: Você fez algum tipo de entrevistas e pesquisas para escrever seu livro?  Com os depoimentos se matizam com a narrativa?

 VIVIANE SANTIAGO: Foram tidas fontes orais, resultado de entrevistas de campo, e pesquisas bibliográficas que são devidamente citadas no final da obra. Os depoimentos foram a legitimação da pesquisa técnica e também fio condutor para que a parte fictícia do livro trouxesse a verossimilhança necessária à um livro temático.


FERNANDO ANDRADE: A relação hoje com a alopatia, com os médicos andam tão doídos. Esta vivência com as benzedeiras de São Paulo me parece um outro diálogo com a pessoa que recebe e absorve a reza. Você acha que o rito é parte deste processo dialógico de cura?

VIVIANE SANTIAGO: Acredito, que a pessoa que busca auxílio para a cura de uma enfermidade pelo uso de ritos de fé, o faz,  exatamente pela premissa de que tais tratamentos usam da homeopatia , onde o indivíduo é a base como um todo, cuida-se da mente, corpo e coração. E as pessoas estão e sempre estiveram carentes de algo tão intimo; enquanto a alopatia foca na doença, de maneira direta e crua.
Uma base não deve descartar a outra. 
Sem dúvidas a ajuda obtida através de processos religiosos e espirituais, para aquele que crê, dialoga com a cura física, que requer cuidados da medicina tradicional. E a junção pode transformar o processo, o tornando mais brando.

 

FERNANDO ANDRADE: Escrever um livro é um rito que damos ao outro leitor. Palavras podem também curar, já dizia alguém. Estou me lembrando do trabalho terapêutico da palavra na psicanálise, esta fé no outro, naquilo que ele tem não de doutrina, mas sim, ensinamentos ou conhecimentos. Fale um pouco desta provável relação com também a reza e o benzimento. 

VIVIANE SANTIAGO:  Acredito que a palavra seja um dos maiores instrumentos de poder dados a humanidade.
Quando vamos a escola e um professor nos ensina aquilo de que ainda somos vazios, recebemos, acreditamos em sua propriedade de saber, assumimos como verdade e aquilo passa a ser de nossa propriedade, claro, cada ser sendo indivíduo singular, irá fazer uso de suas referências culturais, geográficas, econômicas e sociais; absorver e fazer o repasse do que recebeu legitimamente, em fé no outro, que já obtinha tal propriedade. 
Quando vamos pela primeira vez em uma benzedeira, somos como alunos, vazios do que ali, em abundância já é retido em saber. Então ela se utiliza da palavra, do poder da palavra para ordenar conhecimentos que você não tem, e então você é livre para acreditar ou não. Mas a força da palavra emanada em um recinto de fé é de extrema persuasão emocional e também de abordagem para o novo. De estar aberto a conhecer e entender o que ainda se desconhece.
 
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