Fernando Andrade entrevista o escritor André Ricardo Aguiar

André Ricardo Aguiar - Fernando Andrade entrevista o escritor André Ricardo Aguiar

AGULHAS NO PALHEIRO | editoramondrongo

 
 
 

FA.: A gramática é apenas “norma culta” ou também jogo poético com as cores e matizes das palavras?

ANDRÉ RICARDO:  A gramática é um personagem que pode ser modificado, retrabalhado, com suas potenciais ações. No terreno da literatura a norma pode ser a aceitação ou não de regras, daí a liberdade de também usar a gramática em função da liberdade em se criar outros jogos, em validar as mais variadas matizes. Nenhuma palavra pode ser relegada ao seu uso normal. Elas seriam meros apoios. Precisam de um protagonismo, de uma cintilância. Daí, para um espaço tão diminuto que é o microconto, é preciso usar e abusar de todas as possibilidades intrínsecas para as mais variadas violências contra a norma dita culta.

FA.:  Por onde começa a figuração no desenho da frase? Quando você percebe que o fraseado poético, será mais para o humor, ou para um efeito, plástico ou poético?

ANDRÉ RICARDO:  A simples ideia de ter o resquício de uma frase, que para mim serve como unidade motora para construir uma história, já dá o passaporte para o que virá. Então não posso esperar que o leitor preencha de forma aleatória algo que construí tendo como base um determinado efeito muito mais controlado. Se algo que fiz para ter um efeito cômico causa melancolia ou estranhamento, e não o riso, então eu acho que perdi a mão ou o fio que me liga ao leitor. As bases para um microconto são mais claras do que um conto longo ou romance. Eu estou com poucos ossos e eles precisam dar uma liga imediata. Então a escolha me levará, a priori, para um efeito determinado, por um tema já previamente escolhido. Claro que pode haver plasticidade ou poeticidade em algo cômico. Mas são consequências que me escapam.

FA.:  Desperdiçar é uma palavra tabu, nestes seus micro-contos, como não t(r)e(n)tá-los? Para ter o efeito pretendido.

ANDRÉ RICARDO:  É um tenso equilíbrio, e depende muito da situação em que o microconto está inserido. Geralmente o grau de subversão pode fazer crescer em termos de arte, então não se deve descartar nada, pois o máximo respeito deve partir do princípio de evitar a mesmice. E os tabus (ou as palavras que se (des)governam por eles) merecem releituras, provocações, insights.

FA.: Os títulos são um capítulo à parte nesta conju(ga)nção carnal entre ideia e nomeação?

ANDRÉ RICARDO:  Os títulos são portas de entradas orgânicas. Podem muito bem funcionar como o aviso indicativo de que a história pode ser iluminada com esta rima visual. Faço uso econômico do título, sem correr pela tentação de explicar demais, como que entregando o jogo ou o spoiler da mágica. Também evito a cifra enigmática. Tem que ter um equilíbrio para saber puxar o leitor, e não cultivar o seu tédio para algo “mais do mesmo”. Pode ser um bom repositório de ironia ou paródia. Um título que seja o contrário do que vou microdizer. Então é uma arte essa de titular já contando com o ovo da galinha.

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