Romance ‘No crepúsculo da vida’ devaneia a terceira idade sobre as relações de pertencimento do espaço em que se vive | Fernando Andrade

Mazé Torquato - Romance 'No crepúsculo da vida' devaneia a terceira idade sobre as relações de pertencimento do espaço em que se vive | Fernando Andrade

 
 
 
 

Fernando Andrade | jornalista e crítico de Literatura

Quando viajamos para algum lugar de férias, estamos numa relação de escuta com aquele contexto. Não estamos ali todo dia, recolhendo dados e rotinas do lugar. Não há certo perene pertencimento, como buscar um jornal numa banca parisiense numa certa manhã de sábado. Se fazemos, isso rotineiramente, a cena adquire uma familiar intenção cênica e musical que fará de nossa memória, uma certa epifania.
Mas ao nos tornar uma presença constante naquele país, lugar, e bairro, a relação não é mais de escuta sobre a exceção que se recolhia sobre a poética dali. Passamos a colher informações periodicamente, sobre o dia a dia, sentamos num café para repetir o mesmo, talvez, cardápio. Esta presença constante de um pessoa, de uma identidade biográfica sobre relações de pertencimento e deslocamentos, se fazem no romance No crepúsculo da vida, da escritora Mazé Torquato, tão intimista na sua elaboração quase cênica de Paris, ao focar no encontro de duas amigas, que elaboram seus 60 anos, feitos, com muito charme e sofisticação.
Estão para se encontrar num dia aprazível numa certa localidade do bairro. Enquanto espera, Lúcia, a amiga, Marta, chamada por uma notícia de jornal, se interioriza em pensamentos sobre a finitude da vida. Uma senhora foi encontrada desidratada em sua residência, e logo depois, descobriram um corpo do filho quase mumificado dentro de uma banheira. Aquilo a perturba não à ponto de desconcentra-lá do futuro encontro. Mas é um gatilho emocional para pensar na sua própria família que nas horas vindas, perderá uma filha.
Mazé deixa este evento como um leve catalisador de uma avaliação do chegar à velhice, aos 60 anos, onde o espaço para a rememoração de Marta na contação para amiga, lembrando tanto de sua família no Brasil, quanto de suas ocupações para viver no estrangeiro.
A relação de escuta não é mais sobre certa imagem inédita de um evento. Como a cena da mãe com o filho, morto ali. E sim, com a presença do corpo que definha aos poucos, do balanço do passado das duas. São fatuidades que cerram a rotina de lembranças, mas, também de nostalgias ou remorso (?). A vida nos enlaça em seu palco de assiduidades.

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