Entrevista e resenha sobre o livro ‘Guia  de sobrevivência do exilado no próprio país’, do escritor Alexandre Meira | por Fernando Andrade

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ENTREVISTA

 

Fernando Andrade entrevista o escritor Alexandre Meira

 

FERNANDO ANDRADE.: Você começa seu livro e termina ele com dois capítulos sobre a lembrança de sua infância sobre períodos importantes da política e cultura brasileira. Acho muito interessante a metáfora da amendoeira no início do livro e a questão da rua como espaço de exclusão\inclusão, com seus fatos  (o padre indo ver o corpo morto na rua). Como esta experiência pessoal foi importante para levantas outras mais “lembranças” mais calcadas nas fontes ou num trabalho de jornalismo ou ensaio?

ALEXANDRE MEIRA.: Acho que no fundo esse momento histórico que estamos vivendo produziu em nós certas necessidades de ressignificação. Profundas necessidades de ressignificação. Uma forma de fazer isso foi revisitar minha própria infância sob uma perspectiva política e histórica. Tenho encontrado certas respostas que não encontraria se a perspectiva fosse meramente individualista. Talvez o que atraia as pessoas nessa leitura do GUIA DE SOBREVIVÊNCIA DO EXILADO NO PRÓPRIO PAÍS seja ver alguém, o autor, botando a cara pra bater, gratuitamente, contando sua própria história de vida e a assumindo como uma obra coletiva, na medida em que somos furtos do meio, e que sirva de parâmetro para novas formas de compreensão das próprias histórias dos outros. Cada um a sua medida, entende?

FERNANDO ANDRADE.:  Seu livro parece não ter fim apenas com a leitura dos fatos históricos. Ele estuda de forma crítica o futuro com este governo necro-político, onde a pulsão de morte, reina absoluta. Como você vê esta amplitude dele com relação ao que veremos ainda para as eleições de 2022, e futuro político brasileiro, sobre o que você escreveu?

ALEXANDRE MEIRA.: Olha, uma leitora me perguntou como eu poderia ter adivinhado certas coisas que coloco no livro sobre o Brasil de hoje, quatro anos antes. Respondi que na verdade eu não adivinhei nada. Há algo no espírito do tempo de hoje, acredito, que reconte certas histórias já velhas conhecidas nossas de forma apenas diferente para nós, contemporâneos dessa quadra perigosa que vivemos hoje. O Brasil, esse moinho de gente, sempre foi refém de uma espiral de violência e autoritarismo historicamente falando. Apenas nascemos com um pouco mais de sorte que nossos antepassados. Herdeiros do sacrifício de outros. Muitos só estão tendo noção disso agora e tomara que vejam 2022 como uma porta de saída, pois uma nova volta nessa roda de Samsara pode ser muito pior do que imaginamos. É uma lição para nossa geração.

 
 

RESENHA

 

Livro de crônicas ‘Guia de sobrevivência do exilado no próprio país’ exercita arte de ler e ouvir por entre-linhas brasileiras

 

por Fernando Andrade | escritor  e crítico de literatura

 

O diálogo tem suas matizes de acordo com o lugar de onde se emite sua verve muito ligada ao discurso ou pensamento formulado. Mas como ele se processa num país onde seu estrato vem constantemente sendo violentado por cunhos de conservadores e reacionários? Antes do diálogo é necessário escutar, como eu estou fazendo agora – uma resenha sobre um livro que instiga uma convivência à dois, num papo de bar.

O livro provoca este diapasão onde a leitura exercita um discurso em torno daquele que lê, mas também faz a escuta, pois provoca uma reflexão em quem recebe o discurso. Por isso é por demais relevante que Alexandre Meira no seu primeiro livro de ensaios\crônicas, Guia  de sobrevivência do exilado no próprio país, editora Penalux, faça das suas palavras uma ponte, o diálogo entre ouvintes; suas palavras são tão melódicas à ponto de criar um clima de canção, de canto, aqueles que vemos pela lutas pelas diretas, pela redemocratização deste Brasil.

Divididos em cinco suítes, cada com sua particularidade. A primeira é eivada de memorialismo, onde o narrador no subúrbio do Rio descobre a referência de uma amendoeira na sua história.

A imagem não só reflete o momento, como também espraia metáforas sobre o próprio processo histórico do país. Aqui, Alexandre começa a fazer do seu discurso algo tão lógico dentro de crítica da esfera política totalmente perturbada por jeitinhos de se fazer justiça com as leniências da mãos da conveniência.

Através de uma forte sustentação teórica baseada em fontes e apuração jornalística rica, o escritor desconstrói toda ambivalência do impedimento da Dilma Rousseff durante o ano que foi tirada do poder.

Na segunda seção, temos aspectos culturais e sociológicos da formação cordial, do jeito nacional do viver brasileiro, cuja sintonia atual remonta ao 7×1 da seleção brasileira sofrida perante a seleção Alemã.

Alexandre pega todo o imaginário de autores como Nelson Rodrigues e Ponte preta, e disseca nossas neuroses por sucesso, autoafirmação patriótica e por alguma coisa que parece ideal para nação, mas pode ser aplicada ao nível individual: soberania sobre o próximo. Ainda, desmantela toda sorte de armações e corrupções que grassa em Brasília, a mentalidade aburguesada de políticos.

No quarto capítulo, o autor desconstrói a cidade do Rio de janeiro utilizando o assassinato de Marielle Franco e seu motorista Anderson, com forte dados sobre sociologia, faz uma radiografia das milícias e do poder paralelo da criminalidade nas entranhas do poder carioca.
Desmascara a cordialidade carioca sobre as relações entre diferentes, e mostra com o Rio herdou um discurso ultra conservador sobre minorias e preconceitos contra LGBTS.
Na última seção, o autor faz um retorno à infância, quando trilhava os caminhos da rua, e conta um pouco como a mentalidade evangélica foi meio que se promulgando por uma formação social e política na cidade.

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