por Fernando Andrade | escritor, jornalista e crítico de literatura
O olho-cinema capta afetos através de imagens dos nossos olhos. Como trabalhamos estas imagens-afetos, parecem ser num record, onde a cognição amplia os sentimentos armazenados que se atualizam, com informações novas, nunca para de recordar, gravar, as pulsões de um cotidiano familiar.
Não é a lente que altera as percepções do que entra, mas sim, o diafragma da luz, a forma com uma imagem de uma cena de mãe trepando com o pai gruda na retina de um menino de 8 anos. Aqui não digo que a relação entre claro e escuro se deva ao temperamento do menino, como ele recebe esta afecção. É quase então uma forma de trabalhar a escrita interior que ao mesmo tempo é armazém-baú de memórias e trabalho mimético com a linguagem. Luz é como lidamos com a gênese da escrita; o magma do recalque, da neurose, esmiuçado na imagem do fluxo do jorro da escrita. No livro No instante do céu, do escritor Renato Tardivo, editora Reformatório, temos este menino que pende na corda bamba da autonomia de um sujeito cambiante em segurar os eventos do dia a dia.
Renato em vozes que alternam passado e presente, traça com cuidado, este ser que ama mas não consegue ter um vínculo para enraizar o amor da esposa e dos pais. Perder é também trazer o luto para uma forma nova de coloração do mundo. É interessante notar que o autor não tenciona seu enredo como verniz muito analítico, a voz é mais cinematográfica em suas matizes de espaços e lugares reclusos. O traçado do psicanalítico é a mistura das imagens cinescópios de uma escrita caneta que deduz estados do ser por imagens polissêmicas.
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