Fernando Andrade entrevista o poeta Roberto Andreoni

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Fernando Andrade: O que diferencia para você os atos individuais dos atos poéticos? E no meio do caminho construímos políticas, o social. A poética será uma cidadela à parte destes extratos, que só poderá falar de um ponto, distante e não junto? Você parece juntar isso no seu livro, a poética está junto no espaço público ou não?

 Roberto Andreoni: A poesia é um produto social. Mesmo que um poema fale sobre a intimidade do poeta ou sobre uma realidade “extraterrestre”, ainda assim, se você olhar com atenção, o poema sempre vai ser a expressão de determinado momento histórico. Todas as contradições sociais estão ali presentes, com ou sem a consciência do poeta.

 

Fernando Andrade: Seus poemas têm umas imagens moventes que não estancam como um discurso que tem um fim. São torvelinhos até circulares que dançam pelo sentido não só\ único. E a conclusão do leitor sobre o que lê nunca é no alvo, certeira. Como trabalha eles?

 Roberto Andreoni: A proposta do livro foi exatamente essa. Pensar o tempo em sua fluidez. O tempo não pode ser explicado de forma estanque. Nesse sentido, busquei deixar os poemas serem “possuídos” pelo nosso tempo como se ele fosse uma espécie de entidade. Penso que o tempo sirva para criar sentido, mas, quando esse sentido se fecha em um só discurso, o tempo perde sua potência de criação.

 

Fernando Andrade: Talvez pela capacidade cíclica do tempo, o pensamento sobre o ato de criar se torne tão enroscado sobre o ser, como uma fruta com inúmeras camadas, ou como um cebola, com suas rodelas concêntricas. O tempo pode-se dizer que uma arte de relatividade? E o poema também seria, pois, ele abre espaço à toda subjetividade criadora?

Roberto Andreoni: Os gregos pensavam o tempo de forma cíclica, era um tempo mítico, e isso permitiu a construção de algumas artes muito interessantes, como as tragédias. Há ainda alguns autores que aproveitam a potencialidade derivada dessa concepção, como Jung na psicologia e Jorge Luís Borges na literatura. No entanto, hoje eu afirmaria que o tempo, apesar de ser compreendido socialmente de forma cronológica e linear, tem criado várias ramificações a ponto de podermos falar em uma multiplicidade de tempos. Esse fenômeno promove uma abertura e pode ser rico para a escrita. Mas é preciso ficar esperto para não cairmos nas teias do neoliberalismo.

 

Fernando Andrade: Qual é papel da memória nos seus poemas? Quais são os legos que você forma para que ela corporificar no espaço poético?

Roberto Andreoni: Entendo que todo ato criativo é uma reestruturação da memória. Ela é a matéria prima do pensamento. A própria linguagem só pode existir por causa da memória. Então ela é fundamental. Sem memória não há um “eu” (ou “eus”), e sem um “eu” não há a experiência e reconstrução do real. A poesia é uma rearticulação estética do que está na nossa memória.

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