ENTREVISTA | Fernando Andrade entrevista o poeta Fabio Santiago

FABIO INTRAMURO - ENTREVISTA | Fernando Andrade entrevista o poeta Fabio Santiago

 

 

FERNANDO – Não há na sua poesia um sentido exposto, simples, cortinado, por uma significado único. Parece que você transversaliza as palavras criando uma bela dança entre som, sentido, e estética. Fale um pouco disso.

FABIO – O poeta é um ser que sente demais, tudo é beira de abismo, tudo parece enviesado, mesmo quando for magnólia ou dia de sol.
Trabalhei as palavras buscando morar no estado da palavra, onde essa determina o espaço tempo dos versos. Cada palavra ressignifica os sentidos em busca de outras temporalidades, paralaxes, geografias sensoriais e abstratosferas.
O livro narra o processo de escrita e todo o estado patológico que assola o autor ao se defrontar com a página em branco, as doenças de todas as ordens contaminam as palavras.
A escrita como um vício, o verso como intoxicação, estado inflamatório, febre alta.
Em paralelo a isto, uma espécie de parasita do poema, o Tamanduá rupestre (Alter Ego), tatuado na rocha com a sua língua comprida invade a corrente sanguínea dos versos e a linguagem do poema.

 

FERNANDO – Podemos dizer que o efeito dos poemas é sugestionar um clima onírico, de sonho ligado aos movimentos surrealistas, e porquê?

FABIO – O intramuros é um poema para sonhadores, está esculpido em sua carne. Diante disso, posso dizer também que é um poema em furta cor e num movimento constante, metafórico, lírico, que navega por águas agitadas. Quer carpir o mar.
Este estado onírico e de transcendência do poema flerta com os surrealistas e os simbolistas.
Trago em mim alguns escritores como Rimbaud, Mallarmé e Baudelaire, assim como Murilo Mendes e Manuel Bandeira.
Este jogo lírico, esta aventura por novos sentidos, o latente estado metafórico permeia todo o livro, no entanto, quando escrevi o poema não busquei estar inserido em nenhuma escola ou movimento literário, busquei o que a página (tela) em branco me entregava, o que ela trazia para mim, quando escavava a folha (tela) em busca do poema.

 

FERNANDO – Cada tropos de frases parece conter um mundo em particular, como se fosse uma relação com o nome do livro do Saramago, Jangadas de Pedras, de sentidos que parecem tentar uma condensação, mas que nunca conseguem, portanto o sentido do texto ou do poema pode não “fechar” criando um efeito de abstração poética. Com foi lapidar cada palavra para ter esta sensação?

FABIO – O poema Furta Cor deu origem ao Intramuros, ele foi escrito em 2015.
Este poema foi lido pelo escritor e crítico literário José Castello, que na época me alertou sobre a densidade e a originalidade do poema.
Em 2018 o Intramuros estava pronto, após uma busca incessante, quase que diária por uma voz, um ritmo, uma estética de neblina e vertinagem.
Ainda assim, algumas pequenas alterações foram feitas até a versão final de 2020.
A minha poesia muitas vezes, busca recriar palavras, Costurar atmosferas, mastigar as letras, ondular as frases, trazer ventania para a folha em branco, remembrar sensações.
Ao bordar os versos, busquei a aventura por novos caminhos e outros compassos.
O poema é intenso e desestabiliza a linha, causa ventania, quer colocar o leitor sempre em estado de alerta. Posso dizer que correr risco muito me interessa.
Os meus versos moram na caatinga de um estadopoesia, este denomino de Arrebol luzeiro e Mangaba celestial.

Meus versos moram em um sertão amarelo de boca rachada.

 

FERNANDO – As ideias hoje estão separadas por muros, mas, os slogans parecem aderir ao estado de um muro. Elas grudam e separam os divergentes, os horizontes, como a poesia hoje pode língua(via)jar este estado murado das palavras, de sentidos?

FABIO – A poesia deve sempre subverter, deve romper os grilhões que forjaram a nossa mente.
Romper a direita para o outro lado, abrir as portas da percepção, nos fazer ir além do que está posto, o normativo, o estabelecido, o esperado. A língua deve estar sempre solta e viva, nos saraus, nas vielas, nas ruas, quartos, palcos, feiras, festas, mesmo que talhada em páginas, a palavra é solta e livre.
A compreensão de um verso é infinita, mesmo quando este pareça nos levar por águas mansas.
A palavra não poder estar aprisionada e com falta de ar, a palavra deve bailar, livre e solta, sem patrulha, com muito sabor.
A poesia é transgressão e resistência mesmo quando pareça ninar crianças.
Os olhos livres e a mente acesa podem causar uma revolução.
A poesia é indomada e indomável, o dia que ela se sujeitar a regras ou ao pasteurizado estaremos perdidos.
Pintar um poema com todas as tintas, sublimar.
A revolução do verso é não seguir ninguém, nem prosa, nem métrica e nem os bons costumes.
Ser poeta é lambuzar-se do impossível.

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