Cibely Zenari é poeta, cantora, performer e psicóloga. A poesia transborda os suportes esperados. Autopublicou os zines Tril’orgia. Autora da série multilinguagem Eufeminismo, composta por cartazes com sangue menstrual, performance e produção de objeto poético. O universo feminino é produtor e produto de sua pesquisa. Ser mulher é ciclar o tempo desesperado. Vocal e composição na banda Macabea. Participante do coletivo Paetê – palavra e som – performances em espaços culturais. Publicação em revistas eletrônicas e antologias: Zagaia em Revista, Mallarmagens, Diversos Afins, Ruído Manifesto e Casa Literária. Em 2018 publicou o livro 12 Contrações: Guadalupy pelo selo Doburro e o livro online Cartas de amor demais pela Erra publicações. Também publica sob o pseudônimo Clara Zopa nas redes sociais.
quem é vc?
sou uma janela com vidros fechados
sou uma pedra e quando não sou
, uma pedra,
sou o amor
sou os caquinhos de melancolia
quebrados no bolso
sou o peso dos ressentimentos
soul, específicas dores em correntes nos pés
sou o hino obrigatório das crianças
sou o despertador no frio
sou jukeboxes quebradas
sou as mães em luto da zona leste
sou a luta por moradia todinha
sou a viúva de um fuzilado
sou um rim contaminado de mercúrio
sou uma garota cheirando solvente
sou um cio interrompido
estou grávida com 13 anos
sou tão tão brasil que sou brasilândia
sou loser para o capital
graças à deusa
sou o botox que estica e puxa
sou o short da paquita da xuxa
sou a alma estuprada dos homens
que comem lixo
que aumentam em número
sou também a negação da fome
sou a bala que volta em reação
sou sua ração
sou um urso polar groenlandês
sou um vendedor ilegal de geleiras
sou o sagrado feminino e o profano masculino ao mesmo tempo
tenho barba e buceta
sou a barbárie idiotizada
sou o transcurso do discurso evangélico
sou uma promessa alentadora
sou deus mentindo sobre deus
sou zeus filhos que começam com z
sou zécarlos, zémaria ou só zé
sou o palhaço bozo
sou o palhaço assassino do bueiro
sou o fim antes que acabe
sou um silêncio sem reação
sou aquela que precisa ir antes
sou seu desejo de morte
sou meu desejo de sua morte
sou quase sorte
mas sou mesmo, de verdade, a presidenta do sindicato dos bordéis.
***
ninguém aguenta mais a palavra lama
no café da manhã tomo na xícara lama
a piscina refrescante é de lama
olho meus pais e não percebem:
recobertos estão de lama
pelo meio das minhas pernas escorre lama
nos chinelos aos pés da cama, há lama
os verdes, vejam, cor de lama
a palavra poesia se traduzida, é lama
presidentes por dentro lama
expelem lama
hasteada quando bandeira, lama
4 letras, 3 variações, empurradas
sob o enjoo, duto abaixo
engula lama
movediça,
parece que nada pode parar
pensamentos soterrados sobre
lamalamalamalamalama
não adianta fazer a mala
dentro dela, onde for
levará
lama na mala
***
Frútero
12 contrações
compassadas
despressurização
caem as máscaras
primeiro as mulheres
depois as orgias celestes
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