O jornalista Fernando Andrade entrevista com a poeta Isabela Sancho

 
 
FERNANDO ANDRADE – A ideia que temos das flores é muito equivocada? As pessoas, família, nos veem parados, inertes, sem qualquer fluxo vital ( movimento). Como as plantas elas se recusam e nós?

ISABELA SANCHO – As flores costumam assumir um papel decorativo no espaço doméstico. Não dispondo da voz, da palavra ou outra linguagem assimilável pela literalidade humana, são tomadas como se lá estivessem para se prestarem a mera contemplação, e nada mais. Sua função única é ser bela e muda. Do paralelo entre essa condição e a velha expectativa que nossa sociedade tem em relação a uma mulher, assaltou-me a frase “As flores se recusam”, que deu título ao meu primeiro livro.
 

FERNANDO ANDRADE –  A ideia do seu livro passa por uma certa transgressão ao olhar a realidade supostamente estática apenas e querendo uma paz de espírito.  Mas também, uma bela insubordinação, com o arbítrio dos que tem a palavra ( religião, família, Estado). A poesia é arte de desafetar-se, do descontrole verbal,  da linguagem não normativa. Como foi ter estes conteúdos dos temas que você expõe tão bem, formatados à forma?ISABELA SANCHO –  As plantas têm um movimento lento e contínuo, não capturável pelo olho humano, invisível à nossa pressa. Crescem sem que saibamos quando e como, sem alarde, ainda que bem debaixo dos nossos narizes. Então, como se de um dia para o outro, se mostram em seu pleno vigor. Dentre as muitas estratégias para abalar as estruturas do mundo, essa é uma possibilidade que muito me diverte.
 
FERNANDO ANDRADE –  Você parece que mantem nos seus dois livros um fluxo de pensamento coerente sobre a Depressão. Mas ao nomear seu segundo livro aquilo que era imagem-metáfora no primeiro virou conceito no segundo e título. Fale disso.
ISABELA SANCHO –  Em “A depressão tem sete andares e um elevador”, como bem leu Anne Capelo, que escreveu a apresentação do livro, a depressão é trabalhada num duplo sentido: o da formação geográfica e o da baixa emocional. Busquei materializar esse movimento de descida: não só o trabalho com as palavras e espaçamentos entre versos promovem quedas dentro dos poemas, como as ilustrações que desenhei mostram imagens verticalizadas. O formato do livro impresso também foge das medidas padrão para proporcionar essa experiência formal de leitura, o que foi possível pelo trabalho em conjunto com a Editora Penalux.
 
FERNANDO ANDRADE – Seu poder de usar metáforas me encantou. Me fale um pouco como é este processo de cria-las?  

 ISABELA SANCHO –  Antes de me enxergar como escritora, eu me sabia desenhista. O universo das imagens exerce grande impacto sobre mim, é o que dispara meu processo criativo. Ao descrever o que vejo, essas aparentes metáforas surgem de modo autônomo, sem um esforço da minha parte em estabelecer a simetria entre uma coisa e outra.
 
 

Please follow and like us:
Be the first to comment

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Social media & sharing icons powered by UltimatelySocial