Livro de poesias Quase metaboliza relações dialógicas entre autoria, obra, recepção criativa da escrita

 

Talvez a poesia seja os dez dedos das mãos de um morto deitado em (berço não esplêndido) num caixão com as mãos cruzadas. Vá saber o quê estes dedos digitaram ou tocaram podendo ser uma sonata de Bach até um Rock do Raul.

Ah! malditas transmissões entre a veia biográfica deste morto  e o que dele para los otros os conectou como um conectivo, e. Sim já dizia Sócrates, tanto o filósofo como o jogador, o ideal é este lance partidouro como um nascimento; é saber trocar, tocar a  (bola), e referencializar.

 A poesia é uma caixinha de surpresas? Risque palavras de dentro dela e verá  faíscas soltas, voláteis? entre tu leitor e o livro que está lendo, ou  ao anterior que já emprestou ao amigo que nutre por Calvino, o italiano que fez Propostas para literatura do próximo Milênio.

Já dizia Sócrates, o filósofo da bola, é do meio do campo que vemos a intermediária, e pensamos no que fazer num, desenho geométrico, com a bola. Como num quase gol, o último suspiro entre vida-e-morte, o lance cabal entre a feitura do livro e soltá-lo no mundo, e sendo o teu objeto não mais seu. Talvez seja isso,

o livro do poeta Bruno Darcoleto Malavolta, Quase, pela editora Patuá. Um livro que já foi solto no mundo muito antes até do Bruno escrevê-lo. Pois é assim, as digitais do mundo com certas amizades entre parceiros-amigos, troca de correspondências, cartas de amor até musicadas depois por algum letrista que achou num inventário de um morto, talvez aquele mesmo com os dedos cruzados. Bruno atravessa seu livro de forma mais dialógica possível, com versos cruzados, entre ouvintes-leitores criando texturas; pontos nevrálgicos; ironias sobre aparição do leitor e sua desaparição logo depois que o texto morto, não mais pertencido à quem, ninguém? 

Pois com um cuidado extremo, com a linguagem derivativa e expositiva, com a verve satírica e prosódica do próprio ato criativo de expor a cena textual,  o poeta cria em palavras quase como um jogo matemático de combinações muito do que George Perec fazia na narrativa, cruzando dados, comentários, vias-memorialísticas, num recorte combinatório entre vida e experiência biográfica, aqui de um universo pessoal – particular e intransferível sobre o outro.

Antes do mundo adoecer, os poetas e romancistas já adoeceram antes, e fizeram de suas crenças não digo aqui pessoais, pois um escritor é um regur(di)gitador  de suas (es) entranhas,   (doenças). Há uma interessante relação entre elaborar um poema e borrar a imagem da criação entre labor – exposição-referencializada.

  Uma carteira do adoecimento enquanto agente da escrita num processo terapêutico que diria que todo escritor é obrigado à purgar-se com o próprio veneno- remédio, anti-monotonia.

 

cotação: excelente

 

 

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FERNANDO ANDRADE, jornalista, poeta e crítico de literatura. Faz parte do Coletivo de Arte Caneta Lente e Pincel. Participa também do coletivo Clube de leitura onde tem dois contos em coletâneas: Quadris no volume 3 e Canteiro no volume 4 do Clube da leitura. Colaborador no Portal Ambrosia realizando entrevistas com escritores e escrevendo resenhas de livros. Tem dois livros de poesia pela editora Oito e Meio, Lacan Por Câmeras Cinematográficas e Poemometria, e Enclave (poemas) pela Editora Patuá. Seu poema “A cidade é um corpo” participou da exposição Poesia agora em Salvador e no Rio de Janeiro. Lançou em 2018 o seu quarto livro de poemas A perpetuação da espécie,  Editora Penalux.

 

  

 

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