documentários para se ver no futuro
a barriga da mãe é o único planeta natal
estrelas cadentes rebobinarão os céus
durante dezoito anos antes que Sofia
receba as mensagens que os amigos
de seu pai gravaram em vídeo
para o aniversário dela de
duzentas e trinta e quatro luas
temos essa coisa de visitar
futuros que não são nossos
este mundo vai de mal a pior, Sofia
mas está repleto de reis magos
abre os olhos e vem abrir os presentes
que os poetas deixaram para você
Era papel picado e eu pensei que fosse neve
A memória de quando
não éramos
nas proximidades
do que não sabíamos
Cada ano te leva
a origem do não
quando o impossível e nós
perdidos na mesmice das eras
do milagre viemos
para oferecê-lo a alguém
encontrar o porquê
ou o por quem
Venha me cumprir
Escrevo esta mensagem a ti:
faça os pedidos certos
– Olha amor está nevando
para nós – dizem os namorados
E a primavera árabe também
mostrou que os gestos de liberdade
não tem compromisso algum
com as estações do ano
O povo recebia o fim
do inverno com papel picado nas
manifestações de 2013 mas a cidade
estava cada vez mais invernal
vez mais infernal O gás lacrimogêneo
decretava chuva nos olhos de
água gelada é dois água gelada é dois
ó sem violência beijaram molotovs
na boca e a ciência foi clara:
Homens que amam jamais saberão
falar com precisão
sobre fenômenos climáticos
desde pequeno queria ser um apocalipse
o amor repousa entre
a leveza de plumas
que podem esmagar
o mundo
desconhece o segredo
da nuvem que flutua
mas pode pesar
oito toneladas
engolir furacões
como quem respira
o primeiro dia do ano
ensinar paciência aos
apocalipses
aquietar
impulsos de léguas
na sola dos pés
suportar a saudade do sol
coisas corri-
queiras a quem a paixão
é segunda sombra
vou desfazendo a lonjura
o pássaro canta para não deixar
a distância dar um pio
alguém ouvir teu chamado
é mais difícil que
assobiar de modo a fazer
um cometa olhar para trás
mas alguns amores
passam por todos os pontos cardeais
Poemas retirados do livro São poucos os homens que ainda acreditam em baleias (Patuá, 2017)
Vinicius Varela é um facilitador de agoras que ainda acredita em baleias. Casou com a contradição e com a contravenção dos adeuses. O alfabeto da lua cheia é o único que lhe permitiu esse tipo de contrato e contar as histórias de seu tempo. Sua palavra nunca está sozinha. A parte legível é só um codinome.
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