A fina voz da velhice
As velhas pertencem ao ido
passeiam no hipocampo alheio
Dormitam mirando a parede
corpos cobertos de escaras
As velhas voltam aos casulos
rangem os nervos
Pertencem aos ácaros
em lençóis embolorados
As velhas pertencem aos pijamas
são expulsas dos sonhos
Escorrem no ranço dos babadores
amassam os legumes em suas gengivas
As velhas recriam o passado
reúnem-se para catar piolhos
Pertencem umas às outras
em um círculo de força
Lascívia
Ela era Artemísia.
Leitor de Nabokov
o pai deu-lhe o nome.
Flor rica em pólen
protetora dos partos
deu cria cedo
um botão por ano
nascidos em pedra
todos sabor de absinto
assim como Artemísia
degustados por seu pai
Mariana e eu
Mariana era como eu
cheia de vontades
trancadas nas ventas
Enchia os seios
de secreção, pacientava
até formar cálculos
Segredava os desejos
e inflamava o centro da testa
Mariana era como eu
cheia de ausência
trancada no intestino
Armazenava o vácuo
em forma de fezes
Sorria de dentes cerrados
e inflava as pregas
Mariana era como eu
cheia de ódios
engaiolados nos olhos
Encapava a retina
com capa plástica e
escrevia -me olhe-
na etiqueta
Dilatava as veias
e derramava as cataratas
Mariana era como eu
cheia de tristezas
guardadas nas unhas
Encravava a carne
até o andar inchar
nos sapatos
Extirpava as angústias
a alicate cego
Mariana era assim,
como eu.
Karin Krogh nasceu em Mogi das Cruzes, em 1972. Formada em Farmácia pela Universidade Federal do Maranhão, com mestrado e doutorado em Biologia Molecular pela Universidade deSão Paulo. Trocou a ciência pela literatura e publicou os livros infantis “Dondila e Jurema” (Giostri, 2014) e “Mãe é Mãe” (Bamboozinho,2018). Tem poemas publicados em diversas antologias e revistas literárias e lançou seu primeiro livro de poemas “Insídia” pela editora Patuá em 2016.
Be the first to comment