A TEORIA GERAL DO GRITO EM LUIZ OTÁVIO OLIANI
Por Airton Souza
É o poeta Paes Loureiro quem alude sobre a imprescindível questão de quê todo poeta possui uma forma de revelar, por meio de sua poética, uma teoria da poesia. A teoria de uma poética em movimento, sem deixa de ser única, como quem vai arando diariamente as páginas em branco do livro ainda por vir. Uma teoria enrodilhada com a sutileza e a força de uma incansável mão, para com isso, sublinhar traços materiais e estruturais de uma inerente criação poética.
Desde seus primeiros livros publicados é possível perceber e, sobretudo, afirmar que Luiz Otávio Oliani é um desses poetas que está a construir sua própria teoria poética. Ele trabalha como quem recolhe – espacial e temporalmente – palavras e vai conduzindo elas a uma dicção poética, na intenção de formular as marcas de sua própria linguagem. É como se o poeta Oliani fosse um dos apanhadores de gritos, à moda de João Cabral de Melo Neto, e fosse conduzindo gritos ou qualquer ruído para outros estados de coisas ainda mais poéticas.
Hoje, o poeta Luiz Otávio Oliani parece ser um dos únicos da poesia brasileira que consegue apanhar gritos de outros poemas para reelaborar intensos diálogos com a sua lírica e, o seu novo livro Palimpsestos, outras vozes é águas, publicado pela Editora Penalux, é uma grande exemplo disso. De tal modo que o poeta reelabora os signos poéticos de toda uma tradição, sem reproduzir a ideia poética como quem faz pastiche.
Assim, Oliani reconduz para dentro de sua poesia as sutilezas de outras poemas, mas ele aproxima sua expressão poética muito mais à vida que a imaterialidade do ser. Um dos exemplos é o primeiro poema de Palimpsestos, outras vozes é águas. Neste poema a pedra drummondiana ganha movimento no meio do caminho e deixa sua condição estática para com isso flexionar a poesia para as proximidades das tragédias da vida. Com isso, o poeta Luiz Otávio Oliani faz com que a sua poética estenda a mão as dores sobre a vida, ou mesmo nos conduz ao testemunho dos cacos que não se colam mais.
Todo o livro Palimpsestos, outras vozes é águas é elaborado a partir do descortinar da memória do poeta e, ele faz isso como quem expurga os tempos pretérito e presente, ao mesmo tempo. E assim, o poeta faz de seu Palimpsestos, outras vozes é águas um livro de urgência, ou o tempo a que Walter Benjamin denominou de “agora”.
Dessa forma, o traçado de sua poesia carrega um emblema particular que a teoria tradicional da literatura chamaria de relação direta com a intertextualidade, mas, é preciso marcar a diferença que a poética de Luiz Otávio Oliani possui para com isso rasurar a ideia de que sua poesia possui uma dívida com outras poéticas. Pois, os Palimpsestos verbais de Oliani são as entre-vozes metafóricas que atravessam nossos olhos pouco depois de ter ultrapassado a ternura do coração do poeta. Ao feito que Luiz Otávio Oliani vai reelaborando outras dicções, convertendo- as em palavras que se convertam em versos, porque sua poesia:
a poesia independe
de alaridos
– voz do íntimo
a profanar silêncios
Porém é preciso destacar que em Palimpsestos, outras vozes é águas o poeta Luiz Otávio Oliani reconfigura, em parte, sua maneira de lidar com a palavra, fazendo com que cada verso do seu novo livro receba intimamente um necessário corte frontal tal qual a poesia que diz exatamente o que deveria dizer com o mínimo possível de palavras. A escrita de sua teoria geral é perceptível neste poema intitulado Burilamento:
com a ferramenta
o poeta talha a matéria
artesão do infinito
escultor do pensamento
ao polir o nada
faz da palavra
a essência
Os aspectos da teoria geral do grito presente na expressão poética de Luiz Otávio Oliani são visíveis quando o poeta deixa viver dentro de si milhares de outras teorias, por meio das vozes audíveis de uma infinidade de poetas. Assim, juntando gritos ou ruídos o poeta esboça no corpo de seus poemas a tarefa de deixar, sem piedade, vísceras à mostra. Dessa forma, Oliani faz com que as teorias e vozes de outros poetas possam refratar em si mesmo uma assonância incurável, porque segundo Luiz Otávio Oliani:
ser poeta é ir além
da página em que se escreve
Airton Souza – é poeta e professor. Possui mais de 30 livros publicados e já venceu mais de 45 prêmios literários, entre eles: O III Prêmio UFES de Literatura, o Prêmio Dalcídio Jurandir e o Prêmio da Academia Paraense de Letras. Além disso, possui poemas traduzidos para o espanhol, o inglês e o alemão e, atualmente é mestrando em Letras, pela Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará
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