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Amor que não tapa buraco
é o melhor amor que existe.
Vem sem o compromisso
de apagar estragos,
e não desiste apenas de ser amor.
Recebe o respiro perfumado
da hortelã mastigada,
pra matar a sede com a água mais pura.
Amor que não tapa buraco
chega de banho tomado,
com vontade de despentear o cabelo,
com o pedido de esquecer a chapinha
e deixar tudo cacheado.
Eu quero um amor que não tapa buraco,
que o amor feinho, da Adélia Prado,
já está no meu carrinho.
Agora eu posso pedir um amor que não tapa buraco,
amor de quem não se importa mais de ficar sozinho.
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Sete anos
Sete anos a mais e sete anos a menos
saíram pra esquecer feridas recentes.
Sete anos a menos abriu um sorriso no metrô.
Sete anos a mais reparou na beleza
que viu meses atrás.
Sete anos a menos segurou a mão de sete anos
a mais e andaram na rua mais bonita da cidade,
até entrarem numa lanchonete.
De lá foram dividir uma conta.
Sete anos a mais perdeu as contas
entre tantos rabiscos na pele
de sete anos a menos.
Sete anos a menos se perdeu
em curvas demais.
Juntos sopraram as feridas, riram, cantaram,
pra sentir um pouco de felicidade
e menos tristeza nessa vida.
Sete anos a mais gostou demais
de sete anos a menos.
Sete anos a menos nem lembra mais
de sete anos a mais.
Sete anos atrás.
***
Abracei um ramalhete de rosas,
ainda sob o efeito do encanto,
senti que não tiraram os espinhos.
E um espetáculo se fez em minha pele,
vertendo pétalas,
tatuagens e vinhos.
No banho
a mão seguindo o pescoço
percebi um caminho.
Em alto relevo,
duas marquinhas e o espanto.
Foi um vampiro.
Maira Garcia é redatora, cantora, compositora e poeta, nascida em Ribeirão Pires-SP, cidade do Grande ABC paulista. Formada em Propaganda pela ECA USP, autora do blog Depois da Lua de Ontem, com quase 4.000 textos, que estão sendo selecionados para seu livro de estreia com mesmo nome. Atualmente é uma das mediadoras da Roda de Poesia do Centro de Arte e Promoção Social do Grajaú.
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