O livro “Espevitada”: fala sincera do corpo e as suas inclinações sócio-biológicas

O livro “Espevitada”: A fala sincera do corpo e  e as suas inclinações sócio-biológicas

Noelia Ribeiro, Espevitada (2017, Penalux)

 

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Noélia Ribeiro, poeta, reside em Brasília-DF, já publicou três livros de poesia, o mais recente Espevitada, (2017, Penalux), é uma autora que traz no núcleo do seu texto uma energia poética que encanta. Os seus versos por serem bons, encontram com tranquilidade espaço afetivo em nossa memória.

Confesso não é frequente ler poetas contemporâneos, que tenham um alinhamento semelhante ao da Ribeiro, ela tem voos criativos, exerce pacientemente a boa técnica, não demonstra a costumeira pressa, em geral dos iniciantes, que melindram ao pensar em passar seguidas horas à procura de um verso.

O livro “Espevitada” é uma fala sincera do corpo e de suas inclinações sócio-biológicas, desprendida da visão convencional atarraxada pelo imaginário dominante, pensamento que poderia tornar esses poemas perversamente secretos.

A poeta tem um olhar probo, não escamoteia, registra nos seus versos uma salivação, um desejo revelado de explanar com liberdade a sua humanidade, de comunicar sentimentos plurais e existenciais, sem se dobrar ao observar o derredor, se há questionamento da audiência para saber de qual boca ocorreu o pronunciamento. Assim sendo há uma voz liberta que se expande no ar por meio da sonoridade da fala, que dissipa os grilhões, e de modo contundente cria um singular campo de força nas páginas do livro, nascendo a insubmissa espevitada, tornando-se impossível freá-la utilizando o subterfúgio do atual ideário ocidental: impositivo e silente.

Os versos abaixo do poema composto de três estrofes, intitulado Neve em mim, demonstram o seu acertado percurso temático;  revelam um forte poder imaginativo, elevada economia verbal e grande beleza.   As  associações e espelhamentos são evidenciados nas primeiras estrofes; o eu-lirico sabe como alterar as estações emocionais, mas depende do ente amado. O poema sugere que o amor é sonoro, audível, tátil, enfim corpóreo, alcançando  a plenitude  apenas na correspondência afetiva.

O termômetro avisa que é inverno.
O cobertor não derrete o medo gélido
nem aquece o corpo estremecido.

Apenas tu aqui podes reverter
a neve em mim
com tua fala em brasa e
teu corpo em combustão.

Somente a ti pertencem
as temperaturas altas.
Tens na boca o sol.
Tens nos dedos o verão.

Encerrada a leitura de “Espevitada”  despeço-me deste livro com um aceno em uma tarde de outono, lá no alto a esquadrilha da fumaça desenha no firmamento o verso de Horácio “Carpe diem” que deveria ser vivido e nunca olvidado por nenhum humano que tem a possibilidade de exercer no tempo presente a sua existência.

 

 

 

Jean Narciso Bispo Moura  é poeta,  autor de 6 (seis) livros de poemas, o mais recente “Retratos imateriais”, 2017, é também licenciado em ciências humanas, editor responsável pela Literatura e Fechadura – Revista Digital. Estreou em livro no início dos anos 2000, com o título A lupa e a sensibilidade, também é autor de 75 ossos para um esqueleto poético (2005); Excursão incógnita (2008); Memórias secas de um aqualouco e outros poemas (2011) e Psicologia do efêmero (2013).

 

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