RESENHA | A CARNE DE JEAN N. B. MOURA, de Luiz Otávio Oliani

09:18:17“A palavra me faz Deus/ na superfície da carne”
(Versos do poema A CARNE, de Jean N. B. Moura)

A poesia de Jean N. B. Moura, em “Excursão Incógnita”, ratifica: a boa literatura é feita de estranhamento. Os poemas deste livro deixam o leitor estático, em êxtase, sem palavras. Trata-se de uma poesia contundente, que às vezes se faz mínima; mas, ora se faz caudalosa, não no sentido do excesso, mas sim no plano da prosa poética. O autor dialoga com os seus leitores: “Quis ser um grande poeta / Isto se não fosse a exacerbada revanche com a dieta / E consumo anormal de gordura.”
“O poeta sobe na árvore / para colher frutos” e “lê na carne alheia / as coisas às avessas”. É assim que a poesia de Jean Moura retrata o olhar poético do eu frente ao mundo em que se encontra.
Ao dizer que “A palavra é um ser sem fronteiras”, ao dar vida ao elemento chave de sua criação, o poeta, além de abusar de bela metáfora-prosopopéia, sabe construir versos com feição metalingüística e não desaponta o leitor ao dizer em outro metapoema: “Minha boca saliva/ Escreve poemas.”
Tudo o que pertence à vida é matéria poética. Conhecedor de tal realidade, Jean escreve que: “O falo desmedido do tempo / come e arrebenta o ânus da alma” e que “Arredio eu contemplo a pedra de Jacó e a do poeta”. Para ele, “Dias curtíssimos pousam para mim como eternidade”. Logo, quem escreve assim sabe o que faz. Constrói versos rijos como uma casa que merece ser visitada por muitos leitores.
No que tange à estrutura do livro, o poeta passeia por vários vieses. Não se contenta apenas com os versos livres. Vai além. Relê o clássico modernista em alusão ao poema piada e escreve “Oswaldiano”. Bebe do Concretismo em “Suicídio concreto”. Cria imagens altamente metafóricas, muitas vezes construídas com base na associação do concreto e do abstrato como se vê em: “As cruzes serão poucas para arcar com um epitáfio / pois um espírito criminoso queimará sozinho.”, isso sem nomear outros recursos comuns ao autor.
Se “poetas mastigam árvores” e se “sonho apenas, e sou vítima do seqüestro do verso”, nada mais há de ser dito sobre a poesia de Jean N.B.Moura, rica de estranhamento. Basta apenas lê-la, sorvendo-a como vinho fino.

* Luiz Otávio Oliani é natural do Rio de Janeiro, graduado em Letras e Direito. Participou de diversas antologias e tem poemas publicados em jornais do País e do exterior. Com incursões no teatro e no jornalismo, frequentou oficinas e atua no movimento literário da cidade carioca desde 1990, período em que obteve mais de 50 premiações. Publicou “Fora de órbita”, Editora da Palavra, poesia, 2007, livro recomendado à leitura pelo Jornal de Letras, editoria dos acadêmicos Arnaldo Niskier e Antonio Olinto, em outubro de 2007. Em 2008, teve o poema “Teresa” musicado por Maury Santana no CD Música em Poesia, volume 1.

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