Mark – conto de Fernando Andrade

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Mark

Mark nunca tinha sido marcado na escola, nem na lista de chamadas. Um dia passaram a marcá-lo. Mark ia a escola para aprender tanto as disciplinas quanto se socializar um pouco. Mark nasceu e já saiu com este nome. Seu pai adorava outro Mark – o Twain. Mark morava mais ou menos longe da escola, e no ponto de ônibus ele ficava na marquise, lugar que lhe dava uma certa tranquilidade, pois achava que se escondendo ali, ninguém haveria de notá-lo para fazer trocadilhos com seu nome. Ninguém ia notar que ele estava exatamente no lugar que serviria para zoar ele. Pois Mark quando estudou a Revolução Francesa no oitavo ano, alguns gaiatos lhe apelidavam de o marquês; além disso, nas provas de múltipla escolha não conseguia fazê-la pois no enunciado vinha a seguinte palavra: marque a alternativa certa. Todos olhavam para ele, ficava nervoso e acabava tirando zero na prova.

Mark saiu da escola e fez vestibular. Passou por que a prova era dissertativa, se fosse por sua livre espontânea escolha, provavelmente ficaria sem uma profissão de peso que sua família tanto queria. Tinha pela sua frente que esquecer os rótulos pois estes vinham com algo que tinha uma marca. No seu psicanalista ele pensou – falando alto – que eu sou uma marca. Sim, você é uma marca da existência, disse o psicanalista com os decalques que toda marca traz. “O erro é que nos faz existir”.

Viu esta frase num muro quando ia para seu primeiro dia de trabalho. Estava nervoso com medo de dizer seu nome, algo tão próprio dele que pensou em falsificar o nome e dizer que se chamava, Antônio. Quando estava passando por uma marquise viu uma mulher ameaçando pular lá de cima. Era uma situação danada de aflitiva. Parou e olhou para ela, a altura não era nem tão alta, mas ela podia se machucar.

Pensou em puxar papo; mas começou a suar muito. A mulher notou e de lá de cima, perguntou – por que você está suando tanto, meu caro? Eu tenho uma “alergia”. A quê? A trocadilhos. Filhos? Não! Meu nome é Mark. Prazer Mark. Eu sou operada, e tenho um marca-passo no coração. Mas hoje meu coração parou… – por quê? Um rapaz bonito me deixou. Estudei filosofia sabia? O rapaz resolveu se aquietar pois não sabia que viria pela frente, e as lembranças da infância adolescência vinham à sua mente à todo momento. Marcuse. Pelos menos ela estava trocando o K pelo C. Um cara genial que tacou fogo no pensamento da Contra Cultura. Ele ensinava a individualizar-se sem se conformar. Que os rótulos não prestam para nada! Que as pessoas são bombas morais para pegar fogo no sistema! Mark use, fala alto, pulando lá de cima de jeito cinematográfico.

 

 

Fernando Andrade, 50 anos, é jornalista, poeta, e crítico de literatura. Faz parte do Coletivo de Arte Caneta Lente e Pincel. Participa também do coletivo Clube de leitura onde tem dois contos em coletâneas: Quadris no volume 3 e Canteiro no volume 4 do Clube da leitura. Colaborador no Portal Ambrosia realizando entrevistas com escritores e escrevendo resenhas de livros. Tem dois livros de poesia pela editora Oito e Meio, Lacan Por Câmeras Cinematográficas e Poemoemetria , e Enclave ( poemas) pela Editora Patuá. Seu poema “A cidade é um corpo” participou da exposição Poesia agora em Salvador e no Rio de Janeiro. Está lançando esta semana o quarto livro de poemas, a perpetuação da espécie pela Editora Penalux.

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