Há uma simbologia na imagem ou figura do pai. Ele carrega primeiro uma noção religiosa de fé ou devoção ao símbolo de uma sagração, de sagrar a ação. Assim como a fé pode ser um norteio ao campo ou estrada do corpo gerido, aqui não só gerar vem da ação de parir mas também de uma responsabilidade da criação. Fazer do que não existe uma existência concreta e corpórea. Há na questão psicanalítica que o pai introjetaria a lei no universo simbólico de seu filho. O norteio de um caminho à seguir passaria pela visão ou imagem paterna.
Ações requerem demanda tanto de compromisso como de afeto, pois Joana teve uma relação com um homem onde ela morava e ele sumiu logo depois da relação sexual. Um gap surgiu entre a desaparição do homem e a gestação de um filho que nasce, Joaquim, e é parido dentro de um carro de polícia quase um certo laço alegórico ou atávico do caminho futuro do pequeno menino. Joaquim cresce no bairro do Encantado, subúrbio do Rio de janeiro. Sua mãe se muda para uma casa onde mulheres vendem o corpo, mas aqui a noção de venda não faço uma marca de nascença como um rótulo ou um tipo de estigma.
Ali naquela casa, a afetuação do menino se fará presente por aquelas mulheres pelo algum norte que pode ou vir a ter na sua vida. Não há ali um valor nominativo de pecado ou de decaimento como um anjo decaído do paraíso. As regulações se fazem pelo afeto e pela sobrevivência à algum modelo de capital, ( ismo). Joaquim adultiza numa adolescência sempre perto de parentes ou pessoas ( homens) ligados ao jogo do bicho ou a contravenção. Alex Andrade, em seu novo livro, Antes que Deus me esqueça, ( Editora Confraria do Vento) não dinamita nem dinamiza um espectro sociológico para enaltecer ou criticar este contexto social em que Joaquim está inserido. Ele perfaz um caminho de afetivização do que se é próximo.
Das redes sociais de pertencimento, à qual alguém está intrinsecamente ligado. Da posição de hoje, maniqueísta que se corrobora críticas aos desvalidos associando-o à criminalidade. Para uma pessoa que viva em centros como uma zona sul é difícil deliberar como vivem? os periféricos do poder e da riqueza. Joaquim varre sua estrutura emocional percorrendo rostos e sujeitos à procura do homem que o gerou. Inicia sua vida biográfica profissional trabalhando com pessoas ligadas ao jogo do bicho.
Cria laços com estas pessoas, mas parece que ele está sempre flanando ou voando acima de suas posições perante o que está concretando. O livro começa pela sua prisão, onde não comentarei para não dar um visão adiantada do que ele irá encontrar. Ele conhece Jorge, um homossexual que estabelecerá com ele uma amizade que de certa forma ocupará o espaço paterno. O lugar da violência omissiva e oclusiva da ausência.
Fernando Andrade, 50 anos, jornalista, poeta e crítico de literatura. Faz parte do Coletivo de Arte Caneta Lente e Pincel. Participa também do coletivo Clube de leitura onde tem dois contos em coletâneas: Quadris no volume 3 e Canteiro no volume 4 do Clube da leitura. Colaborador no Portal Ambrosia realizando entrevistas com escritores e escrevendo resenhas de livros. Tem dois livros de poesia pela editora Oito e Meio, Lacan Por Câmeras Cinematográficas e Poemoemetria , e Enclave ( poemas) pela Editora Patuá. Seu poema “A cidade é um corpo” participou da exposição Poesia agora em Salvador e no Rio de Janeiro. Lançou em 2018 o seu quarto livro de poemas A perpetuação da espécie, Editora Penalux.
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