Às vésperas dos 80 anos do genocídio atômico de Hiroshima, romance Bicho-da-seda trata do tema da diáspora japonesa

Trama iniciada na manhã de 6 de agosto de 1945 termina com a fixação de japoneses no sul do Brasil

A partir disso e situado entre os anos de 1945 e 1982, o livro trata da diáspora japonesa no pós-guerra ao contar a história de Emi Watanabe, a última descendente de uma tradicional família dedicada à produção da seda que foge em direção à América do Sul. Após muitas agruras e humilhações durante a travessia oceânica, ela chega à costa chilena, de onde parte rumo ao Paraná, no Brasil, cruzando a zona meridional do continente. No trajeto, junta-se a outros japoneses em fuga para, com eles, formar uma pequena comunidade que dará continuidade à criação do bicho-da-seda a partir de algumas lagartas que trouxe consigo.

A partir do dia 6 de agosto de 1945, com a detonação da primeira bomba atômica sobre a cidade japonesa de Hiroshima, evento que determinou a morte instantânea de 80 mil pessoas, o homem, sempre tão angustiado com a perspectiva de sua extinção como indivíduo, passou a ter que conviver com a perspectiva da possibilidade real de sua extinção como espécie. O romance trágico Bicho-da-seda, de autoria do multipremiado autor paulistano Luiz Eduardo de Carvalho e lançado pela Editora Litteralux, principia na manhã desta fatídica data, para contar uma história ligada a um ofício milenar trazido para o Brasil por herdeiros de sericicultores tradicionais japoneses que fugiram de Hiroshima horas antes da explosão.

modelo 3d bicho da seda de luiz eduardo de carvalho - Às vésperas dos 80 anos do genocídio atômico de Hiroshima, romance Bicho-da-seda trata do tema da diáspora japonesa
Em território brasileiro, o destino de Emi redesenha-se e a história prossegue pelas duas próximas gerações, apresentando o processo de superação dos traumas do exílio e a dificuldade de adaptação a uma cultura completamente diferente.

Um livro denso, que aborda em profundidade aspectos psicológicos dos personagens, tanto em suas tendências naturais, quanto nos desvios de suas personalidades, motivadas ou não pelos traumas experimentados. Trata de assuntos delicados como a fobofilia, o estresse pós-traumático e o alcoolismo, bem como dos desvios comportamentais deles derivados.

A marca da tragédia expressa-se pela trajetória do personagem Hirota Higa, um dos poucos sobreviventes do massacre de Okinawa, que se junta a Emi na chegada ao novo mundo e atravessa, com suas débeis tentativas de manter o equilíbrio da pequena comunidade, as histórias de três gerações.

“A Natureza é a senhora dos prodígios. Como em uma imensa orquestra, cada espécie é regida pela partitura de sua carga genética, o que garante o cumprimento de sua determinação biológica de acordo com o desempenho esperado pela existência, mediante o complexo equilíbrio dinâmico do todo. Algumas criaturas, todavia, independem dos elementos condicionantes do meio para enfrentar mudanças, pois contém em si próprias as instruções para atravessarem  grandes transformações e experimentarem o mundo sob formas muito distintas. É como se lhes fosse dada múltipla existência em uma única vida. Às margens do Lago Biwa, a família Watanabe  vivia, há séculos, dos frutos dessa sabedoria traduzida pelas metamorfoses: criavam bichos-da-seda desde tempos imemoriais e produziam alguns dos fios com a melhor qualidade do arquipélago nipônico. No apagar das luzes da Segunda Grande Guerra, seus últimos descendentes migram  para o Brasil, mudança trágica capaz de determinar o fim do longo fio das tradições.”

Segundo o professor, mestre em Literatura Brasileira pela UNB, escritor e ensaísta,  Leonardo Almeida Filho, “o que mais nos surpreende nas histórias de Luiz Eduardo de Carvalho é sua versatilidade; sua coragem em abordar com grande talento temas difíceis, polêmicos; sua ousadia de enfrentar universos diegéticos muito distantes de sua realidade imediata, como podemos constatar em seus grandes e premiados textos como “Sessenta e seis elos”, “Xadrez”, “Quadrilha”, “Cabra cega” e, agora, esse surpreendente monumento ficcional que é “Bicho da seda”.  Salta aos olhos o tremendo trabalho de pesquisa que consumiu o autor para construir uma pequena parte da história trágica e bela da imigração japonesa durante a grande guerra. Na figura da jovem Emi Watanabe, e seu irmão Takeshi, descendentes de uma linhagem nobre de produtores de seda, o autor vai tecendo, como fora ele próprio um bicho da seda, uma história surpreendente de determinação e coragem. Fugindo de um país arrasado, poucas horas antes da explosão da bomba em Hiroshima, um grupo de jovens japoneses, submete-se a toda sorte de abuso por parte de piratas, espécie de coiotes orientais, que os transporta pelo Pacífico até o Chile e, por terra, até o Brasil, passando por Argentina e Paraguai, numa odisseia sem heróis, deparando-se com uma realidade assustadora, clandestinos nazistas na América do Sul, trabalho escravo, tráfico humano, contrabando. Impressiona a representação realista dessa odisseia, com todas as suas tremendas injustiças e crueldades.

O romance, ao adotar o processo de produção da seda, ao representá-lo com minúcia (o que demonstra sua grande capacidade de pesquisa para o tratamento literário), estabelece uma feliz alegoria da própria existência. Poucas lagartas voam, a maior parte delas sucumbe, nos diz Emi em certa parte do livro. E não é justamente o que acontece com todos nós e que acontecerá com os personagens dessa história? O romance acompanha a saga de três mulheres num mundo de barbárie e crueldade masculina: Emi, Sueda e Yoko. Hirota, um sobrevivente do inferno de Okinawa, torna-se o anjo protetor que, aos poucos, mostrar-se-á monstruoso. Não há espaço para personagens redondos, para perfis róseos e confortáveis. Para Luiz Eduardo de Carvalho, a vida é sempre um desconforto que precisa ser enfrentado. A complexidade psicológica de cada um dos seres ficcionais de “Bicho da seda” é um dos pontos altos da narrativa. Luiz Eduardo mergulha sem receio, e sem qualquer julgamento, nas nuances de cada um de seus personagens, suas fobias, medos, taras, desejos. Por trás da maciez e da beleza da seda, um mundo de asperezas e pequenas tragédias vai compondo o painel dessa grande história. Trata-se de um excelente romance, sem sombra de dúvidas, o que ratifica o autor como um dos grandes criadores contemporâneos brasileiros”, completa Leonardo Almeida Filho na sua apresentação do romance.

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Serviço:

“Bicho-da-seda”, romance; p. 222; 14×21 cm – Editora Litteralux

R$ 50,00

(https://www.editoralitteralux.com.br/catalogo-titulo/bicho-da-seda)

fotodoautor luizeduardo - Às vésperas dos 80 anos do genocídio atômico de Hiroshima, romance Bicho-da-seda trata do tema da diáspora japonesa

Luiz Eduardo de Carvalho foi professor, publicitário e assessor de imprensa, jornalista e gestor cultural nos âmbitos público, particular e do terceiro setor. Dedica-se exclusivamente à produção literária desde 2015, já recebeu mais de cem prêmios literários e publicou: O Teatro Delirante, Retalhos de Sampa, Sessenta e Seis Elos, Frasebook, Xadrez, Quadrilha, Evoé, 22!, O Pirata Grilheta e os Dragões do Mar, Um Conto de Réis (e de Rainhas), Crônicas do Ofício, Curtas-metragens, Cabra Cega, Q Absurdo!, Multiversos, Mãos de Deus – Biografia do Padre Júlio Lancellotti, Os Primeiros Músicos e Os Inquilinos.

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