Fernando Andrade entrevista o poeta João Gabriel Madeira Pontes

Joao Gabriel Madeira Pontes poesia 7letras - Fernando Andrade entrevista o poeta João Gabriel Madeira Pontes
 
 
 
 
 

Fernando Andrade: Você consegue elaborar o lírico, com um discurso poético cheio de oralidades, prosa no bom estilo mineiro. Uma conversa entre ti, o leitor. Como trabalhou a escrita desta forma. Comente.

João Gabriel Madeira Pontes: Desde o meu último livro, Manobra de Heimlich, venho tentando explorar o registro oral na poesia, o que, para mim, tem sido um processo difícil. Os meus livros anteriores eram muito centrados no trabalho obsessivo com as imagens e com as formas tradicionais, então mudar o meu enfoque não foi apenas uma tentativa de experimentar com novos estilos, mas também uma maneira de testar os limites da minha própria linguagem. Nesse sentido, embora os poemas de Nada entre dois polegares lhe pareçam dialógicos, devo dizer que em nenhum momento os encarei como uma conversa com o leitor. Na verdade, do ponto de vista formal, o livro é um testemunho do meu contato com outros gêneros, sobretudo com o ensaio, de modo que foi inteiramente montado a partir dessa chave. Assim como em Manobra de Heimlich, os poemas de Nada entre dois polegares foram escritos com uma pergunta na cabeça: como é possível fazer poesia em um mundo que vem perdendo cada vez mais o sentido? E também por isso o livro se estruturou, conscientemente, em torno de outra modalidade de discurso.

Fernando Andrade: Tua poesia não seria um nonsense, não há uma questão do sentido forte, latente que grita na poesia. Você prefere deslizar ele para o interior da linguagem. Comente.

João Gabriel Madeira Pontes: Como eu disse antes, existe uma forte relação entre os poemas de Nada entre dois polegares e a busca por significado — no mundo, na poesia. Portanto, discordo da sua afirmação. No fim das contas, todo texto poético, independentemente da sua forma ou do tipo de linguagem de que se utiliza, é um flerte com o mistério, na medida em que inaugura um modo próprio de compreensão da realidade. Logo, o debate sobre o sentido (ou sobre a ausência de sentido) estará presente mesmo nos poemas mais prosaicos.

Fernando Andrade: O nada é muito associado ao vazio que se trabalha na análise psicanalítica. O vazio pode preencher (aqui um paradoxo), toda uma beleza num trabalho como o seu. Fale sobre isso.

João Gabriel Madeira Pontes: Um dos eixos centrais de Nada entre dois polegares é a questão da promessa, que, para mim, tem menos um viés psicanalítico e mais um sentido político. O livro oferece uma resposta ora otimista, ora cética a essa questão. Nesse contexto, o nada serve tanto como metáfora em alguns poemas da coletânea quanto como alicerce do projeto em sua totalidade.

Fernando Andrade: Há certo humor por demais gestual em certos poemas, você concorda que há neles esta capacidade para o riso mesmo que sutil na maioria das vezes.

João Gabriel Madeira Pontes: Sim, acho que o humor está presente em muitas passagens de Nada entre dois polegares. Talvez isso esteja relacionado com o fato de que, como eu disse, o livro se equilibra entre a esperança e o pessimismo. Diante de uma promessa não cumprida, ou da fragmentação do sentido, há uma expectativa que se frustrou. E uma das reações mais comuns à quebra de expectativa é, justamente, o riso.

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